Conversas, jogos, livros: crianças contam o que mudou em escola que proibiu celular há 2 anos em SP
07/12/2024
Em Ribeirão Preto, unidade de ensino barrou equipamentos para estimular foco em sala de aula e melhora no convívio social. Especialista em educação analisa prós e contras da lei que passa a valer em 2025 no estado. Escolas de Ribeirão Preto se preparam para banir celular
A estudante Betina Nakata Bobato se diverte no recreio com os colegas de classe durante o recreio em uma escola particular em Ribeirão Preto (SP). Aos 10 anos, ela prefere jogar, brincar e conversar com a turma do que ficar ao celular.
“Na nossa escola não pode no recreio [o celular], então eu brinco com meus amigos. Não sinto falta do celular”, diz.
A postura de Betina é reflexo de um incentivo da própria escola. Há dois anos, a instituição proibiu o uso dos smartphones durante as atividades como forma de estimular crianças e adolescentes ao convívio social e a focar no aprendizado em sala de aula.
“Eles não só refletiram sobre essa mudança como pensaram em alternativas. O que eles poderiam fazer para substituir esse tempo de tela? Uma leitura de qualidade, um tempo com a família, uma brincadeira, andar de bicicleta, interação social. Hoje, com essa turma, a gente percebe um momento muito significativo”, afirma a professora Marina Marioti, que dá aulas no 4º ano.
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Flávia e Carolina leem na hora do recreio ao invés de usarem celular em escola que proibiu aparelho há dois anos em Ribeirão Preto, SP
Tiago Aureliano/EPTV
Agora é lei no estado de SP
Na última sexta-feira (6), o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), sancionou uma lei que estabelece para unidades de ensino públicas e privadas em todo o estado a regra já adotada na escola de Betina.
A partir do início do ano letivo em 2025, qualquer equipamento com acesso à internet, como celulares, tablets, relógios inteligentes e outros dispositivos eletrônicos similares, estão proibidos, inclusive nos recreios e durante as atividades extracurriculares.
A exceção vale em dois casos:
quando houver necessidade pedagógica para utilização de conteúdos digitais ou ferramentas educacionais específicas. O uso é apenas para o período da atividade pedagógica, devendo os dispositivos ser armazenados e mantidos inacessíveis aos alunos até uma nova autorização.
para alunos com deficiência que requerem auxílios tecnológicos específicos para participação nas atividades escolares. Nesse caso, o uso poderá ser feito de forma contínua.
O estudante que levar o celular à escola deve guardar o equipamento, de forma segura, sem a possibilidade de acesso no período das aulas.
As secretarias municipais e as escolas da rede privada deverão estabelecer protocolos para armazenar os dispositivos eletrônicos durante todo o horário escolar.
A professora Marina Marioti afirma que rendimento e convívio melhoraram em sala de aula de escola de Ribeirão Preto, SP, sem celulares
Tiago Aureliano/EPTV
Retorno positivo
Na escola em Ribeirão Preto, a professora Marina Marioti afirma que os pais apoiaram a mudança. Eles percebem uma nova postura das crianças não só com relação ao aprendizado, mas nas relações interpessoais.
“Hoje, eu vejo eles mais atentos, até o feedback das famílias foi muito positivo. Eles brincam mais, têm tempo durante o fim de semana, conversam durante as refeições, coisas que estavam se perdendo por esse hábito que a gente foi adquirindo [uso de telas] sem perceber”, afirma.
A estudante Flávia Pimenta revela que, no início, teve dificuldades para deixar o aparelho em casa.
“A gente já estava tão acostumado a trazer e a usar nos momentos livres que foi um pouco difícil adaptar, mas eu senti que melhorou muito, que isso ajudou a gente a conviver mais, a ler mais livros, a jogar mais jogos juntos”, diz.
“Quando a gente estava com o celular, cada um vivia numa bolha. Aí com a orientação, a gente parou de viver nessa bolha e a gente começou a socializar mais, ler mais, jogar mais, tanto que agora a gente tem uma mesa de pingue-pongue no pátio”, afirma a estudante Carolina Boarati.
Crianças brincam em recreio de escola em Ribeirão Preto, SP, que proibiu celulares há dois anos
Tiago Aureliano/EPTV
Prós e contras
Especialista em educação, José Eduardo de oliveira diz que há dois lados na nova lei. O primeiro é que, da forma atual, o celular realmente atrapalha no aprendizado. O segundo é que a tecnologia passou a ser uma aliada dos alunos.
“O lado positivo é que o uso de alguma maneira não habitual do celular em sala de aula estava atrapalhando muito o aprendizado. Estava interferindo diretamente no foco, na capacidade dessa criança focar nos estudos. É fato que o celular atrapalha sim, mas é fato também que ele ajuda muito pedagogicamente desde que bem utilizado”, afirma.
Oliveira chama atenção para o fato de que em um primeiro momento, o processo de adaptação pode causar atritos, e as escolas e os profissionais precisam estar preparados para eventuais problemas de comportamento.
“As escolas vão ter que lidar incialmente com esse processo e vão ter que de alguma maneira desenvolver projetos de adaptação, de conscientização do uso de celular pelo estudante no horário escolar. As crianças vão sentir e talvez isso até atue negativamente no inicio da implantação da lei.”
Estudante foca na lição em escola de Ribeirão Preto, SP, que proibiu uso de celulares
Tiago Aureliano/EPTV
Outro ponto observado pelo especialista é a possibilidade de um novo abismo entre a educação pública e a privada, já que escolas particulares têm mais recursos para substituir facilidades oferecidas pelos celulares no âmbito pedagógico.
“A escola privada vai de alguma maneira arrumar um meio termo nesse processo de utilização de recursos tecnológicos, principalmente no período da aula, e já a escola pública vai encontrar um pouco de dificuldade porque ela é menos abastecida tecnologicamente. Então ela é mais dependente do que a escola privada. Isso pode também ser um problema.”
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